Natasha encontrou sua voz

Natasha Pereira, de 18 anos, encontrou no Nuca/Juva um espaço para ampliar sua voz como jovem e mãe e pela proteção de crianças e adolescentes no seu município

UNICEF Brasil
Foto mostra uma jovem segurando um menina pequena no colo. As duas estão olhando para a foto e sorrindo.
UNICEF/BRZ/Alécio Cezar
17 janeiro 2022

Aos 14 anos de idade, Natasha Pereira soube que estava grávida de Bianca. A partir daquele momento, sua vida mudou. “E desde aí começou a dificuldade”, conta. Logo no início do primeiro ano do ensino médio, precisou parar de estudar para cuidar da filha. “Eu não podia levar a bebê para a escola, minha irmã estava fazendo faculdade e não podia ficar com ela, e minha mãe trabalhava dois turnos. Então eu tive que passar o ano todinho parada”, lembra.

Foi um tempo de muita dificuldade, já que ela precisava ficar em casa e via seus colegas de turma participando das atividades escolares e passando de ano. Tudo isso motivou Natasha para que, no ano seguinte, estivesse decidida a estudar novamente. A situação pouco tinha mudado, mas Bianca já estava maior, assim como a força de vontade da jovem. “As aulas começaram em março. Daí eu pensei, pensei, pensei e disse: vou estudar”, conta.

Natasha nasceu e cresceu em Marechal Thaumaturgo, no Acre, um município com cerca de 17 mil habitantes bem no meio da Amazônia, próximo à fronteira com o Peru. O município foi certificado com o Selo UNICEF na edição 2017-2020 por seu compromisso e avanços pelos direitos de crianças e adolescentes. E foi justamente isso que a fez ter acesso a oportunidades que a ajudaram a seguir em frente depois de um ano difícil.

Foto mostra uma jovem sorrindo para a câmera. Ela está em um ambiente interno. O fundo da foto está desfocado.
UNICEF/BRZ/Alécio Cezar

Estudar e participar
A volta aos estudos não foi fácil. Além de prestar atenção nas aulas e fazer os trabalhos, Natasha passou a levar a filha para a escola e tinha que cuidar dela. O começo precisou de muitas adaptações para que ela pudesse entender essa nova forma de estudar. “Mas, quando viram que eu realmente queria [estudar], eu tive ajuda. Dos colegas, dos professores, do diretor, do coordenador”, diz, lembrando que a professora cuidava de Bianca enquanto ela fazia a prova.

Também foi nesse mesmo período que a jovem começou a participar do Núcleo de Cidadania de Adolescentes (Nuca) em seu município – antes também chamado, em alguns estados, de Juventude Unida pela Vida na Amazônia (Juva) –, uma iniciativa do Selo UNICEF que reúne adolescentes e jovens para que promovam atividades e discutam sobre temas que afetam sua vida cotidiana.

O convite veio de Cleudon França, articulador do Selo UNICEF de Marechal Thaumaturgo, que conhecia Natasha há alguns anos e sabia do seu potencial. “O Nuca foi o braço forte, foi quem puxou o Selo no município. A maior parte dos nossos moradores locais é jovem, tanto da sede quanto da zona rural, e o nosso jovem não tem oportunidade”, conta o articulador.

“Lembro de dias em que eu me derramava mesmo em lágrimas. Quando eu me lembro, me dá uma emoção, porque foi um ano muito difícil. De manhã eu ficava em casa, de tarde eu ia para escola e de noite eu ia pro Juva”, fala Natasha. No início, a jovem achou que a atividade seria apenas uma forma para ocupar a mente, mas pouco a pouco foi percebendo seu propósito de vida por meio do grupo. Foi lá que ela encontrou um espaço para participar ativamente em atividades comunitárias do município, e despertou sua paixão pelos direitos de crianças e adolescentes. “Depois que viramos mãe, não pensamos mais em nós, começamos a pensar no futuro da criança. Aí imagine: nossas crianças protegidas, acolhidas, tendo um espaço para se divertir”, diz.

Ao longo dos quatro anos de Selo UNICEF, cada Nuca precisa cumprir uma série de atividades e uma delas busca discutir sobre racismo nos municípios. E foi justamente durante essa discussão que Natasha recebeu uma grande oportunidade. Para abordar o tema, ela entrevistou o prefeito do município, Isaac Piyãko, indígena, para entender como o racismo impacta a vida de pessoas de sua comunidade. Ela pôde demonstrar o seu potencial e, como resultado, recebeu a oportunidade de estagiar como jovem aprendiz na prefeitura, que deve começar em breve.

Foto mostra uma menina pequena com a mão em um quadro-negro. Ela está olhando para a lousa.
UNICEF/BRZ/Alécio Cezar

Mas esse é só o começo para Natasha. A pequena Bianca está crescendo saudável, já com 3 anos de idade, e Natasha conseguiu concluir o ensino médio em 2021 em meio a todas as dificuldades, e já tem um futuro em vista. Para ela, seu município já avançou na garantia dos direitos de crianças e adolescentes, mas ela quer mais. “Eu tenho um sonho, eu não quero ficar aqui na mesma. Eu quero apoiar e defender as crianças e os adolescentes de todo o mundo, principalmente da minha cidade”, deseja. “Eu quero mudar o município de Marechal Thaumaturgo, fazer ser um lugar melhor para as nossas crianças, nossos adolescentes, jovens e adultos viverem. Que não se torne um município de violência, mas onde haja harmonia”, conclui.

“A importância do Nuca no nosso município foi isso, dar oportunidade aos jovens, direito à voz e à ação. Eles foram a campo e agiram, proporcionaram ações que nem a própria pasta tinha a facilidade de fazer”, conta Cleudon. “Muitos deles saíram do Juva e do Nuca com personalidade formada, autonomia constituída. E a nossa certificação simboliza isso, que o Selo não era só um projeto isolado, era a gestão acontecendo”, completa o articulador, feliz pelas vitórias dos adolescentes e de Marechal Thaumaturgo.